Um Breve Estudo Sobre o Tempo
Dicas para encarar a previsão/viagem no tempo em jogo.
Por: nestokun | 14/03/2018
Em uma triste nota, recebemos a notícia do falecimento de Stephen William Hawking, físico teórico e cosmólogo, um dos maiores cientistas de nossa era.
Nascido em 8 de Janeiro de 1942 – exatamente 300 anos após a morte de Galileu – e conhecido tanto pela doença que o condenou a viver em uma cadeira de rodas (esclerose lateral amiotrófica), quanto pelas contribuições e controvérsias que esteve envolvido no ambiente científico, Hawking falece em uma data também marcante: o aniversário de Einstein (14 de Março). Uma grande perda para a humanidade.
Em um sentimento de homenagem, trago hoje um assunto interessante que já deve ter causado problemas para diversos Mestres e narradores em campanhas mundo afora: a previsão do futuro e a viagem no tempo. Mais especificamente, trago um conselho de como lidar com estas habilidades utilizando nada mais nada menos do que a Física – as teorias aceitas e discutidas nos dias de hoje.
Verdade seja dita, todos os sistemas de RPG possuem algum tipo de habilidade, vantagem ou magia que permitem vislumbrar o futuro. E alguns até permitem viajar pelo tempo, para tentar evitar ou garantir algum acontecimento. Salve a líder de torcida, salve o mundo! Mas gerenciar profecias, previsões e viagens temporais é uma senhora dor de cabeça para um Mestre/Narrador (vou usar só mestre para simplificar): é complicado lidar com jogadores que podem, a qualquer momento, ver o futuro e frustrar toda uma sequência de eventos que muitas vezes é imprescindível para a campanha. O Mestre sabe que tais eventos não podem, ou não devem ser mudados, os jogadores não.
Mas as habilidades/vantagens/magias estão no sistema, e simplesmente proibir seu uso pode parecer arbitrário… demais. Nada resta senão respirar fundo e encarar o problema de frente. E para tanto, que tal ter à mão as duas teorias mais pertinentes quanto ao tempo?
A primeira delas é consideravelmente conhecida, tendo sido desenvolvida por Albert Einstein (aniversariante dia 14 de Março, aliás) e sendo intimamente ligada a famosa teoria da relatividade. Vamos nos referir a ela como Teoria do Tempo Linear, e simplificar a explicação para não dar nó na cabeça dos jogadores.
Segundo Einstein, o Tempo é mais uma dimensão – e como tal, ele não ‘passa’ como nós imaginamos. O futuro, passado e presente são como lugares: eles existem simultaneamente. Ou seja, o futuro é um lugar onde estaremos um dia, mas ele já existe desde já – sempre existiu. Uma linha estendida onde todos os acontecimentos estão escritos, e conforme passamos por cada pedaço dela vamos vendo o tempo se desenrolar.
Se usarmos a Teoria Linear, então previsão e viagem temporal são maneiras de se olhar ou se locomover para um lugar que chamamos de futuro (ou passado), coordenadas nesta linha. Se alguém olha para o futuro, ele está vendo algo que para todos os efeitos já aconteceu. Se alguém viaja no tempo, é porque a viagem já fazia parte da linha do tempo – tudo acontece de acordo com um plano já definido. Qual a importância disto? Simples: não se pode alterar o futuro. Ele já aconteceu, está escrito, é fixo.
Este tipo de teoria permite para o Mestre definir que determinados acontecimentos chave irão acontecer independentemente do que os jogadores fizerem. Mas claro, visões do futuro são enigmáticas, e nem sempre aquilo que o jogador viu é exatamente o que aconteceu. Édipo é um exemplo: uma profecia previu que o filho mataria o pai e casaria com a mãe. Para impedir a profecia, os pais mandaram o filho para longe, o que inadvertidamente desencadeou os acontecimentos que levaram ao futuro que eles tentavam evitar.
Já a segunda teoria mais envolve a Teoria das Cordas, uma teoria que envolve tantos conceitos científicos que eu precisaria de mais de um artigo para tentar explicar o que ela faz. Mas ela possui uma faceta que nos interessa aqui, pois explica a possibilidade da existência de diversos universos paralelos, dimensões onde o universo se desenvolveu de maneiras diferentes do nosso. Basicamente, o Multiverso. Vamos chamar a segunda então de Teoria do Multiverso.
Vimos este tipo de abordagem no filme De Volta para o Futuro, ou na saga dos X-Men Dias de um Futuro Esquecido: alguém viaja no tempo, altera a história e cria um novo universo, uma realidade diferente daquela que o viajante veio. Este tipo de abordagem é muito mais usado na Ficção, dada possibilidade de se trabalhar com múltiplas realidades criadas pelas ações dos protagonistas. Imagine que o tempo é como uma estrada com inúmeras bifurcações; cada vez que alguém faz uma escolha importante (algo que faça diferença no fluxo da história), ele cria duas (ou mais) linhas temporais: uma para cada opção da decisão.
Por exemplo: O personagem escolheu matar um inimigo. Imediatamente surgem dois universos paralelos; um onde ele matou o inimigo, outro onde ele o deixou viver. Conforme mais decisões vão sendo tomadas, mais universos surgem, cada vez mais distantes uns dos outros.
A Teoria do Multiverso permite ao Mestre liberdade completa com efeitos de previsão temporal, e evita o perigo do paradoxo em viagens temporais. Pois quando um personagem faz uma previsão e olha no futuro, ele pode alterar os eventos para desencadear um futuro diferente – efetivamente escolhendo qual dos caminhos ele tomará nas bifurcações do trajeto. Isso gera inclusive uma visão interessante que pode vir a incomodar os jogadores na campanha: se eles impediram um futuro terrível, ele ainda aconteceu em algum universo paralelo por aí? Se eles sobreviveram aqui, existe um lugar onde eles não conseguiram? E se ele falhou em salvar um inocente, um ente querido, filho, interesse romântico, etc, ele ainda está vivo em um universo alternativo!
Abordar tais situações em jogo é mais uma questão de escolher qual a abordagem o Mestre terá diante de como o Tempo funciona. Explicar as consequências de ações baseadas em previsões temporais fica muito mais fácil quando se possui uma base científica.
A única coisa que o Mestre deve ter em mente é que ele não pode alternar entre as visões: ou o futuro é fixo, ou não é. A Física do mundo real, ajudando no RPG.
No mais, bons jogos para todos!