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Espada e Magia | Notícias

Conan, o Bárbaro. Na literatura, cinema e RPG

Conheça um pouco da história do mais famoso guerreiro hiboriano, no RPG e em outras mídias.


Por: Mantsor | 22/02/2018

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Coleção Tormenta RPG

“Saiba, ó príncipe, que entre os anos em que os oceanos tragaram Atlântida e os anos em que se levantaram os filhos de Aryas, houve uma era inimaginada repleta de reinos esplendorosos que se espalharam pelo mundo como miríades de estrelas sob o manto negro do firmamento (…) de todos, o mais orgulhoso foi o reino da Aquilônia, que dominava supremo no delirante oeste. Para cá veio Conan, o cimério de cabelos negros, olhos ferozes, mãos sempre crispadas sobre o cabo de uma formidável espada pronta a ser brandida em luta, saqueador, ladrão sagaz, pirata, assassino frio com gigantescas crises de melancolia e não menores fases de alegria, para humilhar sob seus pés os frágeis tronos da Terra.”

Crônicas da Nemédia

No começo desse mês tivemos o anúncio de que a Amazon está trabalhando numa nova série que contará as histórias do personagem Conan, de Robert E. Howard. Apesar de ainda não termos detalhes, sabemos que um dos diretores de Game of Thrones, Miguel Sapochnik, está envolvido no projeto. Tivemos também o anúncio do retorno das HQs de Conan para a Marvel (que publicou as histórias do bárbaro de 1970 a 2000), que passará a publicar novas histórias em 2019. E além disso, a Editora Mythos publicará uma edição francesa do Conan já em setembro.

Essas notícias são uma ótima novidade para os fãs do cimério, pois indicam uma renovação do interesse da Conan Properties International em expandir a produção de mídias ao redor desse personagem, desde que havia sido suspensa a produção do filme The Legend of Conan.

Aproveitando essas novidades, vamos hoje contar um pouco da história desse lendário bárbaro, desde seu surgimento nas revistas pulp, passando pelas HQs e filmes até os RPGs que adaptaram suas histórias para nossas mesas de jogo.

A Origem

Muitas pessoas acreditam que a ficção fantástica despontou com a obra “O Senhor dos Anéis”, do inglês J.R.R. Tolkien. Embora os primeiros RPGs tenham sido fortemente inspirados pela obra de Tolkien, o gênero “espada e magia”, característico desses jogos, se popularizou nas chamadas revistas “pulp”americanas, publicadas nos anos 1920-30, cerca de 30 anos antes do lançamento dO Senhor dos Anéis.

O texano Robert Ervin Howard se tornou o grande expoente desse gênero ao publicar na revista Weird Tales (a mesma onde Lovecraft publicava seus contos), em 1932, o conto “A Fênix na Espada”, que viria a ser a primeira de muitas histórias sobre Conan e a Era Hiboriana. Escritor prolífico, Howard escreveu várias histórias sobre Conan até a sua abrupta morte em 1936, quando foi publicada sua última história do cimério, “Pregos Vermelhos”.

A primeira história publicada de Conan | Fonte: Weird Tales

Além de Conan, Howard também criou outros personagens memoráveis que viriam eventualmente a cruzar o caminho com o bárbaro na mão de outros autores. O Rei Kull, da Atlântida, viveu milhares de anos antes da era de Conan e guardava muitas semelhanças com o cimério. A guerreira hirkaniana Red Sonja foi inspirada numa personagem de Howard. E o caçador de demônios Solomon Kane, um puritano inglês do século XVI, foi protagonista de diversas histórias de Howard antes de ele escrever sobre a Era Hiboriana.

Vale lembrar também que Howard e Lovecraft foram grandes amigos que costumavam se corresponder por cartas. Por esse motivo, algumas histórias de Conan possuem uma “aura lovecraftiana”, tais como deuses e criaturas que parecem saídos diretamente de um pesadelo de uma mente insana. Algumas de suas histórias fazem inclusive parte dos mitos de Cthulhu, como “The Black Stone” e “The Haunter of the Ring”.

O Renascimento da Fênix

Apesar da morte de Howard, o seu legado não morreu. Diversas histórias inéditas viriam a ser publicadas a partir dos anos 60. Nessa época outros autores começaram também a criar suas próprias histórias sobre o cimério. O principal responsável por esse renascimento foi o escritor de ficção Lyon Sprague de Camp. Além de organizar coletâneas das obras de Howard, ele escreveu histórias como “The Return of Conan” (1957), “Conan of the Isles” (1968) e “Conan the Buccaneer “ (1971). Outros autores que também contribuíram com essas histórias foram Lin Carter e Björn Nyberg.

A incrível arte de Ernie Chan | Fonte: Pinterest

Contudo, a Era Hiboriana se tornaria realmente popular a partir dos anos 70, quando o editor da Marvel, Roy Thomas, decidiu adaptar para os quadrinhos as histórias de Conan. Surgia assim a revista “Conan the Barbarian”, que viria a ser ilustrada por grandes nomes como Barry Smith, John Buscema, Ernie Chan e Alfredo Alcala. O sucesso levou à criação em 1974 de outro título dedicado ao bárbaro, “The Savage Sword of Conan”, que popularizou as histórias em preto e branco e se tornou um dos maiores clássicos dos quadrinhos da época, tendo sido publicada até 1995.

O cimério na interpretação da Dark Horse Comics | Fonte: Dark Horse Comics

Nos anos 2000 a editora Dark Horse Comics adquiriu os direitos de publicação, lançando a partir de 2003 novas séries de revistas: “Conan”, “Conan the Cimmerian”, “Conan: Road of Kings” e “Conan the Barbarian “. Essas histórias apresentaram uma nova interpretação do personagem, incorporando materiais novos e adaptações das histórias de Howard, porém sem nenhuma conexão com o material publicado anteriormente pela Marvel, ainda que a Dark Horse tenha publicado coletâneas das histórias da Marvel. Em 2019 os direitos de publicação deverão retornar para a Marvel.

Conan no Brasil

A editora Abril publicou a “Espada Selvagem de Conan”, de 1984 até 2001 (num total de 205 edições). Além disso ela publicou outras séries como a “Espada Selvagem de Conan em Cores” (1987-1991), “Conan o Bárbaro” (1992-1997), “Conan Saga” (1993-1997) e “Rei Conan” (1995).

Com a passagem dos direitos para a Dark Horse, as revistas do cimério passaram a ser publicadas no Brasil pela Mythos Editora. Tivemos então duas séries periódicas: “Conan, O Bárbaro” (2002-2010) e “Conan, O Cimério” (2004-2008). Nesse período foram publicadas também algumas minisséries, como “Conan – Os Demônios de Khitai“ (2005) e edições especiais, como “Conan – A Cidadela dos Condenados” (2004).

Para aqueles que não tiveram a oportunidade de comprar as primeiras edições  da Espada Selvagem, estão disponíveis dois especiais encadernados com as histórias clássicas da era Marvel: “Conan O Libertador” e “Conan O Conquistador”, ambos pela Mythos Editora.

A edição histórica de Conan | Fonte: Mythos Editora

Ao contrário dos quadrinhos, que sempre foram bem distribuídos por aqui, nunca tivemos muitas opções de livros sobre Conan. Em 1995 a editora Unicórnio Azul publicou algumas histórias clássicas do cimério num formato de livro de bolso (“A Fênix Na Espada”, “A Filha Do Gigante De Gelo”, “A Torre Do Elefante”, entre outras). Em 1996 a Newton Compton também lançou um livro de bolso com a história “Pregos Vermelhos”. Já em 2005 e 2006 a editora Conrad lançou duas excelentes coletâneas com boa parte do material original de Robert E. Howard (“Conan o Cimério”, volumes 1 e 2).

Em 2011 tivemos uma coletânea  intitulada “Conan, O Bárbaro”, da editora Generale, que trouxe o romance “A Hora do Dragão” e os contos inéditos  “Além do Rio Negro”, “As Negras Noites de Zamboula” e “Os Profetas do Círculo Negro”. E finalmente, para a alegria dos fãs, a editora Pipoca & Nanquim lançou em dezembro de 2017 o primeiro de uma série de três volumes com encadernação de luxo e capas originais de Frank Frazetta, também intitulado “Conan, O Bárbaro”, mas que apresentará todos as histórias de Conan na ordem em que foram originalmente publicadas na Weird Tales.

Os Filmes

Apesar da abundância de material, tanto em quadrinhos quanto em livros, só tivemos três adaptações de Conan para o cinema. O primeiro e melhor filme foi “Conan O Bárbaro” (1982), estrelado por Arnold Schwarzenegger e dirigido e escrito por John Milius. O filme contou ainda com a fantástica trilha sonora de Basil Poledouris e a interpretação de James Earl Jones (a voz original de Darth Vader) como o feiticeiro Thulsa Doom.

O clássico – Conan, O Bárbaro de 1982 | Fonte: Google Imagens

Em 1984 tentaram repetir o sucesso do primeiro filme com “Conan O Destruidor”, ainda estrelado por Arnold mas agora dirigido por Richard Fleischer e escrito por Roy Thomas. O vilão agora seria o feiticeiro Toth-Amon, interpretado por Pat Roach (mais conhecido por interpretar vilões genéricos nos filmes de Indiana Jones). Embora eu recomende para os fãs, esse filme é bem mais “leve” que o primeiro e não capta muito bem o espírito de Conan.

Com o objetivo de se completar uma trilogia de Conan, estava planejado para 1987 o lançamento do terceiro filme, “Conan the Conqueror”. Porém o fato de Schwarzenegger estar comprometido na época com as filmagens de “Predador”, fez com que o projeto fosse engavetado. Em 2012 foi anunciada a produção de uma muito aguardada continuação, que contaria novamente com Schwarzenegger no papel de Conan, provavelmente como Rei da Aquilônia, e a direção de ninguém menos que Paul Verhoeven (famoso pelas versões originais  dos filmes Robocop e O Vingador do Futuro ). Em 2014 foi divulgado o título, “Legend of Conan”, porém poucas novidades surgiram. Embora notícias recentes falem do cancelamento do projeto, Schwarzenegger disse também recentemente, em entrevista, que esse filme ainda não morreu.

Arnold Schwarzenegger: o Conan definitivo | Fonte: Reprodução

Mas então qual foi o terceiro filme que foi lançado e sobre o qual ainda não falamos? Em 2011 ocorreu uma tentativa de dar um “reboot”na franquia de filmes de Conan, com o cimério interpretado por Jason Momoa (o Khal Drogo de Game of Thrones) em “Conan, o Bárbaro”. O filme, embora inspirado na história “A Hora do Dragão”,  foi um total fracasso, não chegando nem perto de se pagar. Se perguntar para qualquer fã sério, ele vai negar a existência desse filme. Assista por sua conta e risco.

Os RPGs da Era Hiboriana

Aproveitando o sucesso dos filmes, a TSR lançou em 1984 três módulos (aventuras) para o AD&D: “Conan Unchained!” (CB1), “Conan Against Darkness!” (CB2) e “Red Sonja Unconquered” (RS1). Além da temática hiboriana essas aventuras tinham em comum o fato de serem projetadas para 4 jogadores de nível 10-14 e incluíam personagens prontos bem conhecidos: o próprio Conan, Sonja, Valéria, Nestor e Prospero eram algumas das opções para os jogadores. Embora essa série de aventuras tenha sido cancelada pelo fraco desempenho de vendas, valem a pena com certeza como itens de colecionador.

O primeiro RPG dedicado ao cimério | Fonte: Pinterest

Apesar das aventuras para AD&D não terem feito muito sucesso, a TSR voltou a insistir em trazer Conan para os RPGs e lançou em 1985 o “Conan Role-Playing Game”. Dessa vez o sistema do AD&D foi abandonado em prol de um sistema próprio baseado nas regras do Marvel Super Heroes (outro jogo da TSR de 1984). O jogo vinha numa caixa e incluía três livretos, um mapa colorido e dois dados d10. Mais uma vez o sucesso esperado não foi alcançado, de modo que só foram publicadas três aventuras para esse sistema, todas baseadas em histórias de Conan:  “Conan the Buccaneer” (CN1), “Conan the Mercenary” (CN2) e “Conan Triumphant” (CN3).

Em 1988 a Steve Jackson Games resolveu então adquirir os direitos para publicar um jogo baseado no mundo de Conan. Aproveitando o seu recém criado sistema GURPS (1986), foi lançado o suplemento “GURPS Conan” em 1989, além de 4 aventuras solo (“GURPS Conan: Beyond Thunder River”, “GURPS Conan and the Queen of the Black Coast”, “GURPS Conan: Moon of Blood”e “GURPS Conan the Wyrmslayer”). O livro possui ilustrações originais bastante fiéis ao estilo dos quadrinhos e conta inclusive com uma introdução de L. Sprague de Camp. Além das adaptações tradicionais das regras para a Era Hiboriana, esse suplemento trouxe regras para combate em massa para GURPS, meio que resgatando o espírito dos wargames que deram origem aos primeiros RPGs. Outra curiosidade sobre esse suplemento é que ele foi o único RPG sobre Conan lançado em português, publicado pela Devir Livraria em 1997.

Com o surgimento da licença aberta do sistema d20 nos anos 2000, a Mongoose Publishing decidiu lançar em 2004 o “Conan: The Roleplaying Game”. Esse foi sem dúvida o RPG de Conan que fez maior sucesso, tendo sido lançados quase 40 suplementos, além de três outras edições (a “Atlantean Edition” – 2004, a “Pocket Edition” – 2005  e a “2nd Edition” – 2007). A compatibilidade com jogos como o D&D 3ª Edição e o Pathfinder com certeza contribuiu para essa popularidade. Essa linha de jogos foi mantida até 2010 e ainda hoje é possível encontrar alguns livros à venda, sobretudo da segunda edição.

E finalmente em 2016 a editora Modiphius Entertainment realizou um financiamento coletivo para trazer um novo RPG de Conan. A meta inicial foi batida em poucas horas e ao final do financiamento o valor arrecadado foi de quase dez vezes a meta inicial. Assim, em 2017 foi lançado o livro de regras “Conan: Adventures in an Age Undreamed Of”. Esse jogo utiliza um sistema de regras próprio da editora, o 2d20, utilizado em outros títulos bem conhecidos como Star Trek Adventures e Mutant Chronicles. Como a maioria dos sistemas modernos, ele é bastante focado em interpretação e orientado a ações, não dependendo de extensas tabelas e mecânicas complexas.

O mais novo RPG da Era Hiboriana | Fonte: Modiphius

Além do livro básico já foram publicados também uma espécie de  livro do jogador (“Player’s Guide”), uma aventura (“Jeweled Thrones of the Earth”) e alguns suplementos (“Conan: Book of Skelos”, “Conan the Thief”, “Conan the Barbarian” e “Conan the Mercenary”). Para quem tiver interesse em conhecer o jogo, também foram disponibilizados gratuitamente os PDFs “Conan Roleplaying Game Quickstart”, a aventura do RPG Day de 2017, “The Pit of Kutallu”, e um guia de conversão de sistemas, o “Conan: d20-­to-­2d20 Conversion Guide”. Além disso, a lista de material a ser publicado é bastante extensa, o que confirma a recepção extremamente positiva do jogo.

Algumas curiosidades

O sucesso de Conan inspirou outros artistas a criarem obras que podemos dizer que foram no mínimo “fortemente inspiradas” na criação de Robert Howard. Um exemplo interessante foi o personagem Brakan, criado pelo quadrinista brasileiro Mozart Couto, que chegou inclusive a propor à editora Abril que fosse publicado nas revistas do Conan, mas que acabou ganhando uma revista própria com a editora Opera Graphica – “Brakan, O Bárbaro Vingador”.

Outro exemplo interessante é o personagem conhecido apenas como “El Mercenario”, criado pelo espanhol Vicente Segrelles, e publicado na Europa de 1981 a 2003. Embora incorpore alguns elementos de ficção científica o foco de seu cenário é a fantasia heróica, e é povoado por toda sorte de dragões voadores, monstros reptilianos e guerreiras amazonas.

Robertson “Mantsor” Schitcoski

Robertson “Mantsor” é engenheiro de computação e mora em Brasília. Ingressou no mundo do RPG mestrando todo tipo de cenário em GURPS, que é o seu sistema de estimação. Hoje prefere Chamado de Cthulhu, que já lhe rendeu algumas das melhores experiências com o hobbie.