5 Mundos Alternativos de D&D
Cansado dos mundos "convencionais" de fantasia medieval? Que tal conhecer os mundos de campanha alternativos de D&D
Por: Ghost | 07/06/2018
Salve, salve, aventureiros!
Há algum tempo conversamos aqui sobre cinco mundos clássicos de D&D. Mundos normalmente de fantasia medieval, que atraíram milhares e milhares de jogadores ao longo dos anos, e deixaram uma forte marca na história de D&D (até mesmo continuando a ser editados, mesmo depois de 40 anos!).
Hoje vamos para algo um pouco diferente. Mundos de D&D que não eram tão tradicionais. Mundos com características marcantes, com variados graus de sucesso, mas que terminaram sendo uma espécie de Lado B deste que é, sem sombra de dúvidas, o sistema de RPG mais famoso e jogado de todos os tempos.
Sem mais enrolação, vamos a eles (apresentados sem nenhuma ordem em particular):
Dark Sun
Dark Sun provavelmente foi o cenário mais popular desta lista, e inclusive foi “ressuscitado” na 4ª Edição, em 2010 (a publicação original foi de 1991 até 1996, para o AD&D 2ª Edição). Trata-se de um mundo medieval, mas com uma pegada pós-apocalíptica com toques de Mad Max.
Athas é um mundo destruído pelo uso de magia, que funciona drenando recursos naturais, que acabaram se tornando extremamente escassos, e onde só os mais fortes sobrevivem. Não há deuses em Dark Sun, e se você praticar magia arcana em público, corre um sério risco de ser linchado por uma turba enfurecida (ainda que as cidades-estado sejam governadas por Defilers, os magos de Athas).
Um dos principais diferenciais de Dark Sun que atraiu os jogadores é a presença de raças bastante diferentes disponíveis por padrão para os personagens jogadores. Na concepção original Dark Sun não teria as raças e criaturas clássicas de fantasia medieval. Nada de elfos, anões ou dragões. A TSR, entretanto, ficou preocupada com a (falta de) aceitação que o cenário poderia ter se esses elementos estivessem completamente ausentes, de modo que terminaram ficando na versão final, mas em versões diferentes de suas contrapartes de mundos mais tradicionais.
A coisa fica realmente interessante quando falamos das raças novas disponíveis: meio-gigantes e thri-kreen. Os meio-gigantes são exatamente o conceito intuitivo relacionado ao nome: híbridos de humanos e gigantes (semelhante aos meio-orcs). Já os thri-kreen são, possivelmente, a raça mais alienígena disponível oficialmente para jogadores de D&D: uma raça humanoide, mas semelhante a um louva-a-deus gigante (curiosidade: poucas pessoas sabem, mas embora a versão de Athas dos Thri-Kreen seja a mais conhecida, a apresentação original veio em um suplemento de Forgotten Realms: Monstrous Compendium Forgotten Realms Appendix).
Como bons insetos, os Thri-Kreen possuem três pares de apêndices, sendo que dois são usados como pernas e quatro como braços (sim! Múltiplos ataques por turno!). Garras afiadas, mordida venenosa e habilidades psiônicas (sim! Já chegaremos lá!) estão entre suas outras características.
Outro ponto marcante de Dark Sun é que, como um substituto da magia, foram disponibilizados poderes psiônicos para os personagens. Isso terminou se mostrando um problema duplo: o primeiro é que as regras para uso desses poderes estavam em outros suplementos (Complete Psionics Handbook, por exemplo), e outro é que jogadores de D&D tendem a ser terrivelmente conservadores, e as habilidades psiônicas nunca fizeram sucesso real. Mesmo assim Dark Sun foi tão popular em sua época que gerou dois jogos para computador: “Dark Sun – Shattered Lands” e “Dark Sun – Wake of the Ravager” (isso na era pré-Baldur’s Gate, quando os jogos de PC não ofereciam experiências muito parecidas com o D&D de mesa).
Destaque também para arte do ilustrador Brom, que realizou a maior parte dos trabalhos das publicações de Dark Sun. Com um traço mais sujo e agressivo que o que era utilizado normalmente pelos artistas da finada TSR, ajudava a criar o clima pós-apocalíptico e sufocante deste suplemento.
Planescape
Outro suplemento que terminou gerando uma massa bastante fiel (embora não tão numerosa) de fãs. A cosmologia de AD&D era algo bastante complicado.
Os mundos normais (Toril, Athas, etc…) estavam no Plano Material Primário (ou Plano Primordial da Matéria), que é basicamente o universo onde existimos. O Plano Material Primário é tocado por dois dos três “planos de transição”: O Plano das Sombras e o Plano Etéreo (lembram de Ravenloft? É uma ilha de matéria no plano Etéreo).
Em volta destes temos os Planos Internos (ou Interiores), formados pelos quatro planos elementais (Ar, Água, Terra e Fogo) e os planos de Energia Positiva e Energia Negativa. Em volta de todos estes temos o Plano Astral (o terceiro plano de transição). Para “fora” deste conjunto estavam os Planos Externos (ou Exteriores): Celéstia, Elísio, Gehenna, Nove Infernos e outros (totalizando 27).(Caso estejam se perguntando, sim, isso é uma simplificação. AD&D ainda tinha os planos para-elementais, quase-elementais e outros…)
Essa bagunça toda não foi criada de uma vez. Foi o resultado de anos e anos de aventuras, cenários, mundos e suplementos, e é natural que o final fosse algo como uma colcha de retalhos.
Planescape veio para costurar adequadamente esses retalhos todos e, de quebra, fornecer alternativas de aventuras em locais que os suplementos descreviam como “acessíveis apenas a magos, clérigos e druidas de altíssimo nível”. Em Planescape era possível viajar entre os diversos mundos do Plano Material Primário e entrar em quaisquer outros planos através de Sigil, a Cidade dos Portais.
Sigil, uma cidade em forma toroidal (Google it!), se conecta a todos os planos de existência simultaneamente, e o acesso a Sigil é feito através de (dã!) portais. Cada portal é acionado com um determinada chave e, nesse caso, a definição de “chave” é bastante elástica.
Na verdade, uma das maneiras mais simples de colocar os personagens em Sigil é através de um simples acidente. Ele atravessou a porta da taverna em um determinado horário, em uma determinada condição, carregando um determinado objeto mundano. Exemplo: logo após a meia-noite, em uma noite de lua crescente, carregando sem querer um pedaço de pele de frango frita. O personagem (ou grupo) sente a típica sensação de desorientação provocada por teletransporte (sobretudo teletransporte involuntário). Quando se dão conta, estão em um lugar jamais visitado antes. E agora? Procurar um meio de voltar para casa ou aceitar a nova realidade (Caverna do Dragão feelings)?
Planescape era uma alternativa muito interessante aos mundos padrão de D&D, principalmente por não precisar descartá-los. Pessoalmente, sempre gostei muito de fazer os personagens dos jogadores viajarem entre mundos e/ou planos de existência, como uma forma de aproveitar ao menos um pouco de cada um dos maravilhosos mundos, mas infelizmente nunca tive a chance de colocar a Cidade dos Portais em uma campanha.
Devido a sua relativa popularidade, Planescape gerou dois jogos para PC: “Planescape: Torment”, que veio já em uma geração pós-Baldur’s Gate, que terminou por se tornar uma espécie de cult-game bastante apreciado, e “Planescape: Tides of Numenera”, apenas inspirado no cenário.
O principal ilustrador dos livros de Planescape, Anthony DiTerlizzi, também merece palmas. Com um traço completamente diferente do usado em D&D até então, dava todo o clima de estranheza necessário para uma ambientação como esta.
Birthright
Birthright tem muito em comum com os mundos padrão de fantasia de D&D mas, ao mesmo tempo, se distancia bastante deles.
O mundo de Birthright é Aebrynis, mais especificamente, o continente de Cerilia, e os jogadores assumem o papel não dos aventureiros que conhecemos de outros módulos, mas sim de governantes com poder garantido pelos por sua linhagem (bloodline).
O conceito de linhagem vem de um poder divino adquirido por ancestrais dos personagens jogadores, e que se manteve ao longo das gerações. Essa herança divina garante uma aura chamada Regência, que garante aos personagens o domínio sobre uma espécie de feudo.
O cenário se baseava mais em jogos políticos do que nas tradicionais aventuras. Provavelmente foi esse o principal motivo de esse cenário não ter feito lá grande sucesso entre os jogadores de D&D. Quem curte jogos políticos e diplomacia procura outros RPGs que não D&D, onde a maior parte dos fãs quer mesmo é colocar as botas na lama ao procurar aventuras. (Curiosidade: Birthright tem um conceito de “Turnos de Domínio”, análogos aos turnos de combate, mas com duração de 3 meses em tempo de jogo, para medir as ações dos jogadores relativas aos seus domínios).
Outro diferencial de Birthright é que apresentava cinco diferentes sub-raças para humanos (um conceito que, normalmente, era aplicado apenas a raças semi-humanas).
Red Steel
Red Steel é um daqueles mundos que não é exatamente um mundo, mas sim uma região contida dentro de outro mundo. Neste caso, a Savage Coast é uma região de Mystara.
O módulo tem uma série de diferenciais:
A Maldição (“The Curse”) ou Maldição Vermelha (“Red Curse”): A região da costa da espada é toda “coberta” por um efeito mágico, que terminou ganhando este nome. Todos que entram na região sofrem seus efeitos: uma poder mágico extraordinário, chamado de Legado (“Legacy”) e, se não forem tomadas as devidas providências, uma deformidade (que pode se manifestar como perda de saúde, perda de atributos, ou mesmo algum tipo de deficiência física ou mental). O livro “básico” apresenta uma série de lendas de origem da maldição, além da origem oficial (que, obviamente, não vamos mencionar aqui).
Entre os Legados (o livro apresenta 80 opções, mas nada impede que o Mestre crie as suas próprias) estão poderes limitados de cura, forma animal, poder de respirar na água, velocidade e muito outros. Cada poder tem seu efeito colateral associado. Se o Legado for Respirar Água, Poe exemplo, o personagem ganha guelras. Se for Velocidade, pernas extras… Alguns efeitos colaterais podem ser BEM bizarros.
Red Steel apresenta, também, uma série de substâncias mágicas, todas diretamente ligadas à Maldição Vermelha:
Vermeil: Uma poeira mágica vermelha, encontrada no solo e no ar da região. O Vermeil é inevitavelmente inalado e ingerido por todos que estão na região, mas não tem maiores efeitos, além da sua suave aura mágica.
Cynnabril – Um raro metal mágico, que apresenta um brilho avermelhado. Quando utilizado em contato com a pele o Cynnabryl protege dos efeitos da Maldição Vermelha, mas apenas por um tempo. A característica protetora vai se perdendo com o tempo, e é necessário encontrar mais Cynnabril, ou sofrer os efeitos da Maldição.
Red Steel – O metal que dá nome ao cenário. Feito de Cynnabril esgotado (já sem suas propriedades de proteção), o Aço Vermelho não brilha (ao contrário de sua forma original), mas se trata de um material duro, sem ser friável, mantendo um excelente fio e pesando metade do aço tradicional. Como se trata de uma substância inerentemente mágica, armas feitas de Aço Vermelho podem atingir criaturas vulneráveis apenas a armas mágicas (embora não possuam um bônus base).
Existem outras, mas as mais características são essas aí.
O livro também trás algumas raças novas: Lupins (espécie de seres meio-humanos, meio lupinos), Rakasta (humanoides felinos), Tortles (Tartarugas humanoides. Alguém aí a fim de parodiar as Tartarugas Ninja?) e Aranea (Aracnídeos que podem assumir forma humana), esse últimos muito ligados à magia.
Além de todas essas características, Red Steel tem uma pegada um pouco menos Fantasia Medieval, e um pouco mais Swashbuckling. Trata-se de um suplemento muito interessante, mas que nunca atingiu o grande público e, infelizmente, como boa parte desta lista, terminou morrendo juntamente com a segunda edição de AD&D.
Spelljammer
Ok. Hora de fazer algumas confissões. Dessa lista toda, tenho um carinho muito especial pro Spelljammer. Já, já conto o motivo.
Nenhum módulo de D&D em toda a história arriscou mais do que Spelljammer. É, nada mais, nada menos que D&D no espaço, em um clima de “Ficção Medieval”, com uns toques de pirataria.
Nesse módulo existem os “Spelljamming Helmets”, acessórios mágicos que, quando utilizados por personagens com habilidades arcanas, podem ser usados para comandar naves espaciais capazes de viajar entre os planetas. A ação conveniente dos “Spelljamming Helmets” faz com que os navios/naves tenham sempre uma gravidade confortável, e que os corpos do ocupantes estejam rodeados por uma espécie de bolha de ar, trazida do último mundo visitadop, suficiente para cerca de três meses à bordo.
A cosmologia de Spelljammer, entretanto, é bem diferente da do nosso mundo real. Em um conceito que parece vagamente inspirado na descrição do sistema solar feita por Kepler no Mysterium Cosmographicum, aqui temos as “Esferas de Cristal”, que contêm os sistemas planetários dentro de si, e os mantêm separados do Espaço Selvagem (“Wildspace”, no original). A superfície destas esferas não pode ser danificada por nenhum meio conhecido, mágico ou mundano, mas portais podem ser abertos (eles também surgem espontaneamente) permitindo a passagem.
O Espaço Selvagem é habitado pelas raças mais alienígenas de D&D (mas também pelas raças comuns). Elfos, gnomos, beholders, ocultos (“Arcanes”), Giffs, Neogi, Thri-Kreen… todos passíveis de serem encontrados à bordos de naves (e diversas raças com naves “típicas”). Os infames Illithds são outra raça bastante comum no espaço.
A parte divertida de Spelljammer é exatamente a de, por exemplo, começar uma campanha em Karameikos, seguir para Dragonlance e finalizar em Forgotten Realms, tendo os devidos percalços no Espaço Selvagem entre uma etapa e outra, como uma espécie de Jornada nas Estrelas misturada com D&D.
E é daí que vem o carinho pessoal que tenho por esse módulo. Quando mestrava com relativa frequência, sentia uma necessidade imensa de utilizar o maior número possível de suplementos. Na campanha mais épica que mestrei os personagens começavam em um mundo próprio (uma bela colcha de retalhos com pedaços de Forgotten Realms e Karameikos), mas precisavam chegar em Ravenloft para solucionar o plot e, só então, retornar ao próprio mundo. Se na época tivesse acesso a esse suplemento (só fui conhecê-lo anos mais tarde), haveria muito mais etapas, com toda a certeza.
De forma parecida com Planescape, Spelljammer unifica os mundos de D&D, mas, ao contrário do primeiro, aqui toda a ação fica restrita ao Plano Material Primário (nada de viajar para os planos exteriores).
Depois disso tudo, também não é difícil entender por que Spelljammer teve vida curta. O fã típico de D&D é extremamente conservador e tradicional, e não costuma aceitar bem uma salada de fantasia medieval com ficção científica como esta (e, convenhamos, realmente não se trata de uma suplemento para todos os gostos).
Uma última curiosidade: Na última aventura do módulo introdutório First Quest os personagens encontram uma nave dessas, deixando um gancho para novas aventuras. Por outro lado, por algum motivo a Abril optou por, em sua versão do “Livro dos Monstros” suprimir, na descrição dos Ocultos (Arcanes) a linha que menciona que eles são os fabricantes dos “Spelljamming Helmets”.
É isso aí, queridos leitores do UniversoRPG! Na nossa opinião esses são os mundos mais iconoclastas da história de D&D. E na de vocês? Acham que faltou importante na nossa lista? Conte para a gente aí nos comentários!
Henrik “Ghost” Chaves
Henrik “Ghost” Chaves é fã de D&D (mas acha que a edição 3.5 foi a melhor de todas) e de tudo relacionado aos Mitos de Cthulhu. Música (rock), literatura (fantástica), cinema (pipoca) e boardgames (modernos) estão entre seus outros hobbies.